Espaços urbanos

Espaços urbanos
Catedral Nossa Senhora da Conceição - foto Robispierre Giuliani

sábado, 18 de outubro de 2025

Tributo aos que construíram o Château d'Eau

O Château d’Eau é o nosso maior símbolo cultural e chega ao centenário consagrado material e simbolicamente.  Sua história, cantada e decantada, demonstra a capacidade que nossos antepassados tiveram de olhar para o futuro, assentando nos subterrâneos da terra os condutos que não só levaram água e esgoto para os lares cachoeirenses, mas incluíram o município no seleto grupo daqueles lugares que conseguiram emergir de um passado de estagnação e atraso. E, mais do que isto, conseguiram dotar a cidade de monumentos que entregaram não só funcionalidade, mas valores estéticos que garantiram a admiração imediata tanto naquele distante ano de 1925 como em todo o tempo que veio depois, chegando hoje aos 100 anos mantendo o seu fascínio.

Construção do Château d'Eau - A. Saidenberg 

Château d'Eau recém-inaugurado - MMEL

Os anseios de fazer Cachoeira se desenvolver tiveram início um bom tempo antes da inauguração da Segunda Hidráulica, da qual faz parte o Château d’Eau e o reservatório enterrado da Praça Borges de Medeiros, inaugurados conjuntamente porque trabalhavam em sintonia. Em 1911, Isidoro Neves da Fontoura deu os primeiros passos para dotar Cachoeira de uma hidráulica. Por coincidência, Isidoro era o pai daquele que inauguraria o complexo hoje centenário, o Dr. João Neves da Fontoura. Mas a iniciativa do Coronel Isidoro não logrou êxito. Em 1921, outro intendente, Aníbal Lopes Loureiro, deixou como legado de sua administração a Primeira Hidráulica, inaugurada em 20 de setembro de 1921, cuja caixa d’água segue a abastecer e adornar as adjacências do Hospital de Caridade.

A Primeira Hidráulica não satisfazia totalmente a necessidade de levar água aos lares cachoeirenses. Sua abrangência não ultrapassava o limite norte da Praça José Bonifácio, de modo que a zona alta da cidade continuava mergulhada no afã de obter água da velha forma, ou seja, através dos pipeiros ou da coleta em outros mananciais. Com a construção da Segunda Hidráulica, a água atingiu a dita “cidade nova” que se erguia acima da Estação da Viação Férrea.

Francisco Fontoura Nogueira da Gama foi o intendente que assinou os empréstimos necessários para tão importante obra, mas a sua saúde debilitada determinou que se afastasse da administração municipal, cabendo ao jovem João Neves da Fontoura, vice-intendente, a sua execução e inauguração.

Todos estes nomes da vida político-administrativa de Cachoeira são amplamente conhecidos e difundidos, assim como os dos profissionais responsáveis pelo planejamento e execução das obras da Segunda Hidráulica. Saturnino de Brito, Walter Jobim de Siqueira, Antônio de Siqueira, Giuseppe Gaudenzi, João Vicente Friedrichs, firma Silveira, Soares & Cia. são nomes que consolidaram esta história. Mas quem foram os que, anonimamente, ergueram os monumentos que hoje enaltecemos e que há mais de 100 anos os fincaram na terra? Pois são estes homens, trabalhadores nas mais diferentes funções, algumas delas perdidas no passar do tempo, que merecem também o nosso aplauso e reconhecimento.

Graças ao acervo documental preservado no valoroso Arquivo Histórico do Município é que foi possível levantar 310 nomes de trabalhadores que tiraram das pranchetas dos seus idealizadores o Château d’Eau que hoje admiramos e aplaudimos. Certamente alguns de nós carregam nas veias o seu sangue e boa parte do suor que derramaram no afã de executarem suas tarefas foi derramado no solo que depois foi ajardinado e embelezado para nossa admiração e deleite.

São eles:

Abilio Sousa

Adalberto Costa

Adão Cruz

Adão Oliveira 

Agenor Alves

Alberto Almeida

Alberto Dalma

Alberto Pedrozo

Alberto Trento

Alcides Silva

Alexandre Machado

Alvaro Lewis

Amadeo Martins

Amaro Dornelles

Ambrozino Porto

Ananias Rodrigues

Anapio Carvalho

Anaurelino Vieira

André Ferraro

Angelo Bonfoco

Angelo Ferrari

Angelo Peloso

Antenor Siqueira

Anthero M. da Silva

Antonio Francisco

Antonio Loureiro

Antonio Moreira

Antonio Morejano

Apparicio Machado

Aracy Figueiró

Aristides Alves

Armando Asplanato

Arthur Lara

Astrogildo Garcia

Ataliba Rodrigues

Augusto Alves

Augusto Ferreira

Avelino da Silva

Balbino Domingues

Balthasar Bicca

Baptista Carvalho

Basileu Santos

Basilio Farias

Belarmino Castro

Belmonte Lara

Benedicto Paulo

Bernardino Nascimento

Braz Avila

Candido Carvalho

Carlos Pacheco

Clarindo Saraiva

Claro Mendes

Claudino Rodrigues

Clemente Sezino

David Pedrozo

Demetrio Soares

Deoclecio Ferraz

Domingos Delzovo

Doralino Ferreira

Dorico Corrêa

Eduardo Ferraro

Eduardo Soares

Egydio Peluso

Ernesto Thomaz

Erothildes Lopes

Estacio dos Santos

Estevão Rosa

Euzebio Lemos

Ezequiel Silva

Faustino Franco

Favorino Fernandes

Florencio Leguiça

Floriano Saldanha

Florisbaldo Alves

Francisco Assis

Francisco Claudiano

Francisco Lewis

Francisco Lopes

Francisco Moraes

Franklin R. Maia

Gabriel Fonseca

Gaspar Cardozo

Geraldino Nunes

Geronymo Ilha

Giuseppe Rissieri

Godofredo Athayde

Gomercindo Alves

Gregorio Braga

Guilherme Athayde

Henrique Loureiro

Herculano Lucas

Hilario Aguir [sic]

Hilario Costa

Honorio Ayres

Horacio Barreto

Izidoro Garcia

Jacy Lewis

Januario Santos

João A. Lopes

João A. Rodrigues

João Antonio

João B. Grecca

João Belmonte

João C. Barcellos

João C. Ilha

João Candido

João Cardozo

João Cosubk

João da Silva

João Damazio

João Dutter

João F. Pedrozo

João Felix

João Ferraro

João Francisco

João Garcia

João Gonçalves

João Lemos

João M. Alves

João Medeiros

João Pantaleão

João Papajorge

João Rodrigues

João Rosalino

João Smuthini

Joaquim Cunha

José A. Cardozo

José Corrêa

José Lopes

José Miranda

José Modesto

José Pereira

José Rasck

José Ribeiro

José Simões

Julião Lopes

Julio Domingues

Julio Guedes

Julio Matheus

Julio Rosa

Julio Ruport

Justino Silva

Ladislau Peixoto

Laurindo Silva

Levindo Rosa

Libanio Santos

Lucas Pinhac

Luiz Caetano

Luiz Copede

Luiz da Silva

Manoel Alves

Manoel Candido

Manoel Cassiano

Manoel Pacheco

Manoel Rodrigues

Manoel Vidal

Marciano Pereira

Marcondes Silveira

Marcos Bezerra

Marcos G. d'Oliveira

Mario Costa

Martins Pio

Martins Proense

Miguel Petronilio

Napoleão Alves

Narcizo Santos

Nathalino Fernandes

Nelson Vieira

Octacilio Loureiro

Octacilio Machado

Ottonor Cunha

Pacifico Pereira

Pantaleão R. Santos

Paulo Machado

Paulo Moreira

Pedro Dornelles

Pedro Pedrozo

Pedro Pereira

Pedro Risso

Pedro Simões

Porfirio Peixoto

Possidonio Gonçalves

Propicio Carvalho

Ramão Dutter

Ramiro Chaves

Ramiro Lemos

Reduzindo Colmedeiro

Regino Moura

Reinaldo Paulo

Roberto Rosa

Roldão Costa

Rosalino Machado

Salustiano Martins

Sergio Motta

Sergio Pereira

Setembrino Carvalho

Silvino Claudiano

Simplicio Carvalho

 Suely Brum

Theobaldo Rodrigues

Theodoro Vieira

Vergilino Macedo

Vergilio Rosa

Vicente Ferreira

Vicente Granado

Victalino Lemos

Waldomiro Silva

Zeferino Aguir

As suas funções na obra eram de aparelhadores, pedreiros que dirigem o trabalho de corte e colação de pedras; apontadores, que fazem levantamentos e registros diários nos canteiros de obras; boches, que transportam por carretas; cavouqueiros, que abrem buracos ou cavoucos; manilheiros, que assentam as manilhas, além de serventes, rondas, contínuos, calceteiros e capatazes.

Texto produzido para ser lido na solenidade comemorativa do centenário do Château d'Eau, promovida pela Secretaria Municipal de Cultura, em 18 de outubro de 2025, às 20 horas, quando representei o Arquivo Histórico do Município e o COMPAHC. As atividades tiveram o apoio da UFSM-CS, ASSOARTE e ASCART.

terça-feira, 30 de setembro de 2025

O poderio dos bancos na nossa história

Para mensurar o poderio das instituições financeiras em nossa história, um ótimo começo é analisar as edificações que elas foram capazes de erguer em diferentes épocas.

O Banco da Província 

A primeira instituição do gênero a se instalar em Cachoeira foi o Banco da Província em 1911. No dia 18 de maio, na esquina da Rua 7 de Setembro com a Rua General Portinho, autoridades, industriais, comerciários e imprensa se reuniram para prestigiar o grande acontecimento. Daquele evento restou um importante registro fotográfico, pelo qual é possível verificar várias personalidades de destaque da época, bem como a representatividade da chegada do Banco da Província ao município. Naqueles tempos, as lavouras de arroz já tinham produzido o suficiente para fazer de Cachoeira uma das mais poderosas economias do estado.

18 de maio de 1911 - inauguração da agência do Banco da Província - MMEL

No meio da multidão que se postou defronte à agência, destacam-se as figuras do Coronel Isidoro Neves da Fontoura, então o intendente do município, acompanhado de alguns dos servidores municipais, dentre os quais Emiliano Carpes. Também são notadas as presenças do jovem João Neves da Fontoura, Aurélio Porto e João Jorge Krieger. E, como não poderia deixar de ser, os músicos de uma banda, aparato obrigatório quando o evento era de destaque. 

Pois foi o Banco da Província o responsável por erguer um dos mais significativos prédios para sede de instituição bancária no coração da cidade. Dois anos depois da inauguração da caixa filial, veio o anúncio de construção de uma edificação de dois andares na esquina da Rua 7 de Setembro com Andrade Neves. A obra só foi erguida 16 anos depois da inauguração da primeira filial, em 1927, e se constitui hoje num dos mais belos e imponentes prédios tombados de Cachoeira do Sul, sediando desde 1983 o Palácio Legislativo João Neves da Fontoura, pois o Banco da Província já havia encerrado suas atividades, sendo incorporado por outras instituições bancárias que deram origem ao Banco Sul Brasileiro.

Banco da Província recém-inaugurado - 1927 - Coleção Claiton Nazar

Palácio Legislativo João Neves da Fontoura - Imagem Rádio Fandango

O Banco do Brasil

Em 5 de maio de 1919, abriu as portas para a comunidade cachoeirense o Banco do Brasil, então a maior e mais poderosa instituição financeira brasileira, fundada em 1808. O Banco do Brasil, atestando a importância econômica do município, abriu aqui a sua quinta agência no estado do Rio Grande do Sul, e a de número 42 no Brasil.

Instalado provisoriamente na antiga Travessa 24 de Maio (hoje Rua Dr. Sílvio Sopel), quase na esquina com a Rua 7 de Setembro, pouco depois o Banco do Brasil comprou o prédio da extinta firma Knorr & Eisner, promovendo reformas e adaptações para nele inaugurar sua agência própria em 1924. Este prédio, igualmente imponente, constitui outro bem tombado do nosso patrimônio histórico-cultural.

Banco do Brasil (1924) - Coleção Claiton Nazar

O Banco do Brasil ergueria mais um prédio, cuja inauguração ocorreu em 1946, edificação que ainda hoje marca a "subida dos bancos" e toma o nome de edifício Anna Scarparo Sório.

Agência do Banco do Brasil na subida dos bancos (1946) - Acervo institucional
            

Subida dos bancos, estando a 3.ª agência própria do Banco do Brasil à direita - foto Jorge Ritter

Em 1969, o Banco do Brasil mais uma vez iniciaria a obra de sua terceira agência própria, com três andares, na mesma Rua 7 de Setembro, esquina com Dr. Milan Kras. A conclusão se deu em 1970. As diferentes edificações que lhe serviram de agência atestam não só o desenvolvimento da instituição, mas também marcam os diferentes momentos econômicos e estilos arquitetônicos referenciais de cada período.

Agência central do Banco do Brasil - Acervo institucional

O Banco Pelotense

O Banco Pelotense, fundado em Pelotas no dia 5 de fevereiro de 1906, teve sua primeira representação em Cachoeira no ano de 1916. Em 1922, inaugurou a agência própria, na Rua 7 de Setembro, esquina com a atual Rua Presidente Vargas. Imponente, o palacete hoje pertence ao BANRISUL e é uma das joias da arquitetura local, sendo tombado pelo Estado do Rio Grande do Sul como patrimônio histórico-cultural.

Banco Pelotense - Coleção Claiton Nazar

Agência do BANRISUL - foto Renato Thomsen

Além das instituições bancárias que tiveram suas sedes transformadas em patrimônios tombados de Cachoeira do Sul, há aquelas que têm o reconhecimento como inventariadas e as que, mesmo na ausência de tutela de proteção, seguem a compor nossa paisagem urbana como elementos marcantes. Umas deixaram de ser instituições bancárias, outras ainda conservam a utilização original. Mas o que importa é que, independentemente do uso que adotaram, continuam a representar uma história de grandiosidade econômica e por que não dizer, seguem a desafiar o presente a não esquecer o passado, para poder fazer uso de suas experiências no futuro. Em breve, nova postagem as contemplará.

domingo, 3 de agosto de 2025

Ernst Julius Rieth

Em 31 de julho de 1945 falecia, no interior do município de Cachoeira do Sul, o arquiteto alemão que deixou um legado de obras públicas e particulares, muitas das quais ainda existentes. Trata-se de Ernst Julius Rieth, ou apenas Júlio Rieth, nascido em 1.º de abril de 1871 em Neuenhaus. 

Julius Rieth - Acervo familiar

Na sua necrologia, publicada no Jornal do Povo, edição de 2 de agosto de 1945, é possível perceber sua inserção na comunidade cachoeirense:

Júlio Rieth. Faleceu repentinamente em Marupiara, no exercício de sua profissão, o Sr. Júlio Rieth, engenheiro construtor residente nesta cidade. Júlio Rieth nascera na Alemanha, mas já há uns 30 anos estava radicado no Brasil. Era casado com a Exma. Sra. D. Frida Rieth e deste matrimônio deixou os seguintes filhos: Kurt Rieth, atualmente residindo na Alemanha, Ernesto Júlio Rieth, casado com a Exma. Sra. D. Wanda Horbe Rieth, e a senhorinha Hildegard Rieth. Sua morte ocorreu quando trabalhava em Rincão da Porta, às 8 horas e meia do dia 31 de julho p. p., na construção de uma casa para o Sr. Ervino Hamann. Os atos de sua encomendação e sepultamento realizaram-se ontem, saindo o féretro da casa mortuária, sita à Rua Nova, para o Cemitério Municipal. Júlio Rieth, espírito trabalhador e profissional competente, era bastante estimado nesta cidade. (p. 4).

O jornal O Comércio também repercutiu a sua morte na edição do dia 8 de agosto de 1945:

Necrologia no jornal O Commercio, 8/8/1945, p. 1 - Acervo de Imprensa do AHMCS

Na ocasião do seu falecimento, Júlio Rieth estava trabalhando na construção da ponte sobre o arroio Irapuá, uma das tantas obras públicas executadas por ele para o governo municipal. 

Sua formação foi obtida na Koenigliche Baukewerkschule, de Stuttgart, onde ingressou em 1901. Depois de formado, trabalhou em obras na mesma cidade, deixando um legado construtivo importante, inclusive um conjunto de prédios que sobreviveram à II Guerra Mundial e são hoje tombados.

Em 1914 emigrou para o Brasil, fixando-se depois em Cachoeira. Em 1918, seu nome estava associado aos do engenheiro civil Hans von Hof e do engenheiro-arquiteto Ernesto Schlosser, que mantinham escritório à Rua 1.º de Março. Em 1925, era sócio de Roberto Jagnow em escritório de engenharia que foi responsável, dentre outras, pelas obras de construção do Armazém de Paschoal Gazzaneo, do Cine-Teatro Coliseu e da Casa Alaggio, todos na Rua 7 de Setembro.

Casa Alaggio - Rua 7 de Setembro - MMEL

Cine-Teatro Coliseu - Rua 7 de Setembro - foto Renato Thomsen

Outra importante obra arquitetada por Julius Rieth foi o primeiro prédio do Colégio Imaculada Conceição (1927), hoje Totem, no Bairro Santo Antônio. 

Projeto do Colégio Imaculada Conceição - MMEL

Várias residências ainda existentes na cidade têm a assinatura do engenheiro-construtor, dentre elas a famosa Casa 500, cuja reforma que lhe deu a feição atual foi por ele executada em 1917 para o então proprietário Djalma Pereira da Silva. A casa anterior a esta reforma pertenceu ao Comendador Antônio Vicente da Fontoura, localizada na esquina das ruas 7 de Setembro com Conde de Porto Alegre.

Casa 500 - foto Renato Thomsen

Maiores informações sobre este grande e ilustre engenheiro-construtor alemão, que se radicou e faleceu em Cachoeira do Sul, deixando um legado impressionante, podem ser encontradas no trabalho da arquiteta Vera Grieneisen no link: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/85915/000909483.pdf?sequence=1&isAllowed=y

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Coletividade

Em algum momento da história de Cachoeira do Sul o senso de coletividade foi perdido. Pautas importantes para a cidade não têm hoje a importância que teriam para gerações passadas. Certamente vários fatores contribuíram para o arrefecimento da união, com claro prejuízo ao desenvolvimento municipal. Tal constatação se torna mais realista quando vemos desaparecer um cidadão que talvez tenha sido uma das últimas lideranças imbuídas do espírito da coletividade, do bem comum e não apenas das vantagens individuais: Dr. Julio Cezar Mandangaran Caspani.

Dr. Julio Cezar Mandagaran Caspani - Acervo familiar

Nossa história tem vários exemplos de união em torno de interesses que se tornariam importantes para o conjunto de cidadãos. Um dos mais expressivos é certamente o de criação e instalação do Hospital de Caridade, ideia que foi lançada pelo advogado Ernesto Barros, em 1903, e que conquistou e segue conquistando toda a cidade. É o HCB a maior prova da capacidade coletiva do povo cachoeirense. 

Hospital de Caridade e Beneficência - foto Renato Thomsen

Outro exemplo foi a iniciativa tomada em 1912 por industriais, comerciantes e poder público no intuito da construção de uma ponte que permitisse a travessia do rio Jacuí, uma vez que a ponte construída no passo geral do mesmo rio não existia mais desde o final do século XIX. A obra sonhada em 1912, que só aconteceria a partir da década de 1950 e resultaria na Ponte do Fandango, beneficiou e segue beneficiando, indistintamente, tanto o empresário, o produtor, quanto os cidadãos comuns que necessitam dela para seus deslocamentos.

Ponte do Fandango - foto Jorge Ritter

Entidades foram, por muito tempo, carreadoras de ideias que beneficiavam a comunidade, mas parece que até elas se fecharam em torno dos interesses de sua representação, de forma que vivemos em um mundo corporativista e, portanto, excludente ao invés de ser inclusivo e coletivo. 

Em 1935, problemas na viação férrea, responsável pelo principal meio de transporte da época, juntamente com o fluvial, provocou reação da Associação Comercial de Cachoeira, antecessora da CACISC - Câmara de Agronegócio, Comércio, Indústrias e Serviços. Por conta da falta de transporte para o arroz, então o principal produto da economia cachoeirense, o presidente da Associação Comercial, Júlio Castagnino, enviou telegrama à Federação da Associação Comercial, em Porto Alegre. O presidente, representando seus pares, solicitava intervenção junto ao diretor de tráfego da Viação Férrea para o fornecimento imediato de nove carros previamente solicitados à estação local para carregamento de arroz destinado ao Paraná. A demora no transporte, segundo justificava Júlio Castagnino, prejudicava o comércio do arroz cachoeirense que sofria concorrência dos produtores paulistas, além da ameaça dos destinatários de anularem as compras.

Por outro lado, também em função do mesmo problema com a viação férrea, uma comissão da Associação dos Varejistas, de olho na possibilidade da criação da estrada de ferro Pelotas - Cachoeira, que faria da nossa cidade ponto terminal da linha férrea que ligaria o porto de Rio Grande ao centro do estado, dirigiu-se ao comandante da guarnição local, autoridade no assunto. Ernesto Pertille Filho, presidente da Associação dos Varejistas, acompanhado de Orlando da Cunha Carlos, Patrício de Albuquerque, Pedro Bopp e Jacy Bidone saíram com a resposta de que o comandante estava à disposição para colaborar nos estudos do assunto. 

Largo da Estação Ferroviária - MMEL

A história mostra que as demandas de 1935 não se concretizaram a pleno. Os problemas com o transporte ferroviário persistiram, ainda que por este meio muita riqueza tenha sido levada e trazida, culminando com a sua paulatina substituição pelo transporte rodoviário. Quanto à linha Cachoeira - Pelotas, também ficou apenas no campo das ideias. Se tivesse se concretizado certamente o panorama teria sido outro e, quem sabe, até sustentasse por mais tempo as linhas de trens que atravessavam e uniam o país.  

Outras causas ganharam grupos diversos, algumas vencedoras, como o estabelecimento da UERGS, da UFSM e a união de cidadãos em torno da preservação de bens culturais, como a Ponte de Pedra e o Paço Municipal, para citar movimentos mais recentes. 

UERGS Cachoeira do Sul - foto Renato Thomsen

UFSM - Campus Cachoeira do Sul - foto Renato Thomsen

E agora, pelo transcurso da 25.ª FENARROZ, maior evento que o município organiza e que só acontece porque há união de cidadãos a seu favor, somos convidados, como comunidade, a unir esforços para torná-la grande e reconhecida novamente. Se quisermos o seu fortalecimento e retomada de protagonismo na área orizícola, se buscamos o desenvolvimento e o fortalecimento de nossa economia, cultura e sociedade teremos que pensar como conjunto, pois só assim realizaremos o que almejamos. Inspiremo-nos no exemplo do Dr. Caspani, sempre otimista e disposto a abraçar causas que visavam o bem comum.