Espaços urbanos

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Temporal no Centro Histórico - foto Francisco Nöller

terça-feira, 19 de abril de 2016

"Todo dia era dia de índio!"

Como diz a letra da música “Todo dia era dia de índio”, eternizada na voz de Baby Consuelo, resta ao índio do Brasil o dia 19 de abril para que a sua cultura seja minimamente lembrada.

Índio brasileiro - Jean Baptiste Debret

A história de Cachoeira do Sul não pode ser contada sem referir a presença indígena nos seus primórdios. Segundo Aurélio Porto, o grande historiador, no decorrer dos anos que se seguiram à assinatura do Tratado de Madrid (1750), cerca de 700 famílias de índios catequizados seguiram o português Gomes Freire de Andrade em direção a Rio Pardo, sendo estabelecidas nas proximidades do rio Botucaraí. Os espanhóis, representados por Cevallos, governador de Buenos Aires, tentaram reconquistar estas famílias oriundas das missões, levando-as para os seus domínios e com este intento enviaram a Rio Pardo dois padres jesuítas, que fracassaram na tarefa. Cevallos, numa última tentativa, solicitou a Gomes Freire que convencesse os índios a voltarem, no que obteve negativa por entender Gomes Freire que eles estavam protegidos pela bandeira portuguesa. E assim estas famílias foram aproveitadas para darem início a povoações que geraram várias cidades rio-grandenses, dentre elas Cachoeira.

Um contingente destes índios foi arranchado nas proximidades do Passo do Fandango, estabelecendo as bases da futura Cachoeira. O ano era 1769. Em 1780, do montante de 662 habitantes da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Cachoeira, 383 eram índios.

Mas o que foi feito desses índios? Que legado deixaram à cidade dos dias de hoje? Quase nada restou do período em que os índios catequizados habitaram a Aldeia, embora sua presença esteja comprovada nos livros de registro dos primeiros habitantes, em assentos de batismos, casamentos e óbitos. E dentre estes registros, seguidamente aparece algum “infiel”, ou seja, índio não catequizado de tribos nômades.

Do contingente inicial de índios assentados pelos portugueses na Aldeia ou dos demais que naturalmente habitavam o território rio-grandense restaram traços culturais indeléveis e principalmente uma herança ligada à terra, traduzida pelos toponímicos que identificam rios, montanhas, vales. E ainda que desaparecidos materialmente do dia-a-dia, o sangue dos índios circula nas veias de muitos cachoeirenses.


quarta-feira, 13 de abril de 2016

Pedro Faz Tudo

Nossa história está cheia de personalidades interessantes, homens e mulheres que fizeram diferença nos mais diversos segmentos e áreas, muitos dos quais desapareceram da lembrança, apesar do sentido que suas vidas emprestaram à Cachoeira de outros tempos. Relembrá-los é oportunidade de mostrar aos cachoeirenses de hoje o quanto foram capazes de contribuir para a consolidação social, cultural, intelectual e material da comunidade mesmo sem terem tido grande notoriedade.

Uma destas personalidades viveu e deixou marcas em Cachoeira no final do século XIX e início do século XX. Era o italiano Pietro F. Battisti Allegri, ou Pedro Fortunato Baptista, que ficou popularmente conhecido por Pedro Faz Tudo.

Segundo saiu numa edição antiga da Revista Aquarela, de Humberto Atílio Guidugli, Pedro Fortunato Baptista “era homem de iniciativas admiráveis desenvolvidas por uma inteligência invulgar.”

Falecido em 1933, aos 77 anos, este homem que procedia de família da alta aristocracia italiana morreu pobre, solteiro, assistido pelo amigo Henrique Comassetto “que o acolheu nos últimos tempos de sua existência”, segundo publicado na necrologia do jornal O Commercio de 1.º de fevereiro daquele ano.

O primeiro registro que se tem de seu espírito inovador foi em 8 de fevereiro de 1896, quando apareceu desfilando pelas ruas em um velocípede, primeiro veículo deste tipo a aparecer em Cachoeira.


Modelos de velocípedes do século XIX - praiadexangrila.com.br

Foi de sua iniciativa a fundação da primeira casa de exibições da cidade, o Cinema Parque, ao ar livre, surgido em 1909 de sua associação com o também italiano Victorio Livi. Em sociedade com  Rodolfo Homrich, no mesmo ano de 1909, abriu a Fábrica de Licores, situada no Alto dos  Loretos, com depósito também para vinagre.

Pedro Fortunato Baptista, súdito italiano que era, representou seu país como agente consular, sendo também um dos fundadores e presidentes da Sociedade Italiana Príncipe Umberto, inaugurada em 1912, quando compôs a nominata da primeira diretoria como secretário.


Sede da Sociedade Italiana Príncipe Umberto - Cachoeira
Endereço: antiga Rua São João, hoje Pinheiro Machado
- Grande Álbum de Cachoeira - de Benjamin Camozato (1922)


Carta do agente consular da Itália em Cachoeira - P. F. Battisti Allegri
- Acervo documental do Arquivo Histórico

Em 1916 aparecia outro investimento de vulto do Pedro Faz Tudo: a Fábrica de Sacos de Aniagem e Algodão, em sociedade com Archimino Campos e Waldemar Nunes dos Santos, para a qual foram importadas máquinas dos Estados Unidos.

Mas Pedro Faz Tudo também tinha outro dom: o da oratória e escrita. Segundo o mesmo artigo da Revista Aquarela, produzido por Humberto Atílio Guidugli, “Muito cooperou tanto na imprensa, como nas solenidades em que era indispensável a sua presença, produzindo artigos de expressivo fundamento filosófico e discursos encantadores e exuberantes na grandeza do seu sentido.”

Não há por enquanto imagem conhecida de Pedro Faz Tudo, mas ele transformou a Cachoeira de seu tempo, de forma que sua passagem pela nossa história deve ser lembrada como exemplo de inventividade, empreendedorismo e espírito inovador.