Espaços urbanos

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Ninfas do Château d'Eau - foto Robispierre Giuliani

segunda-feira, 31 de março de 2025

A Cachoeira de 1915

Em tempos muito diferentes dos nossos, quando comunicação instantânea e redes sociais estavam muito longe de se tornarem ferramentas do cotidiano, jornais, periódicos, relatórios de governantes e almanaques costumavam publicar dados estatísticos dos municípios, nos quais se incluíam de aspectos urbanos a aspectos morais. 

O jornal O Commercio, edição de 5 de janeiro de 1916, traz dados do município de Cachoeira preparados e difundidos através do Relatório de Estatística da Intendência Municipal relativos ao ano de 1915, quando estava no posto de mandatário municipal o vice-intendente em exercício, Capitão Francisco Gama. O encarregado do serviço de estatística era então Mário Godoy Ilha, que os apresentou em 17 de setembro de 1915. 

O relatório diz o que segue:

ESTATÍSTICA PREDIAL: A cidade, com as duas zonas – urbana e suburbana – tinha, em 1.º de setembro de 1914, 1.281 prédios. Dessa data à sua igual de 1915 construíram-se 71, somando, portanto, a 1.352 as casas existentes.


Aspecto da Rua 7 de Setembro em 1914 - MMEL

Uma confrontação interessante dão as cifras abaixo dos prédios construídos nos últimos anos:

1910 – 16

1911 – 44

1912 – 66

1913 – 98

1914 – 50

1915 – 54

Soma: 328

Os construídos em 1915 são: de madeira 32, de alvenaria 22; nesse ano fizeram-se ainda 25 aumentos, reconstruções e reparos, 10 galpões e nove muros.

ESTATÍSTICA DEMOGRÁFICA: População – era em 1913, a 31 de dezembro, de 44.239 almas, a qual adicionando-se 1.526 unidades, do excesso fisiológico, atinge para 1915 a 45.765, sendo 23.027 homens e 22.738.

Pelos distritos, esta população está assim distribuída:

1.º distrito (sede e arrabaldes) – 10.016

2.º distrito – 4.611

3.º distrito – 2.862

4.º distrito – 4.778

5.º distrito – 6.841

6.º distrito – 9.666

7.º distrito – 6.991

Soma: 45.765

Tomando por base a densidade predial de 6,6 encontrada no ano anterior, tem a cidade 8.923 almas.

Registro Civil – registraram-se em 1914 1.928 nascimentos contra 1.478 de 1913, ou seja, mais 450. Eram homens 999 e mulheres 929.

Pelos distritos municipais, os nascimentos ficaram distribuídos deste modo:

1.º distrito – 834

2.º distrito – 84

3.º distrito – (não informou)

4.º distrito – 65

5.º distrito – 285

6.º distrito – 474

7.º distrito – 186

Soma: 1928

Quanto à filiação:

São filhos legítimos – 1.678

São filhos ilegítimos – 250

Soma: 1928

Nacionalidade dos pais:

Brasileiro e brasileira – 1.506

Brasileiro e alemã – 23

Brasileiro e diversas – 5

Alemão e brasileira – 43

Alemão e alemã – 54

Alemão e diversas – 4

Italiano e brasileira – 11

Italiano e italiana – 251

Diversos e brasileira – 22

Diversos e diversas – 10

Soma: 1.928

Nasceram:

De dia - 988

De noite – 940

Soma: 1.928 

Realizaram-se 330 casamentos ou menos 92, sendo 439 nubentes alfabetos e 221 analfabetos.

A mortalidade decresceu sensivelmente, fato digno de nota que evidencia a excelência do estado sanitário do município.

Óbitos de 1912 – 602

Óbitos de 1913 – 498

Óbitos de 1914 – 402

Por distrito, os óbitos deste último ano estão assim subdivididos:

1.º distrito – 120 homens, 97 mulheres, total 317

2.º distrito – 3 homens, 2 mulheres, total 5

3.º distrito – (não informou)

4.º distrito – 3 homens, 5 mulheres, total 8

5.º distrito – 31 homens, 31 mulheres, total 62

6.º distrito – 36 homens, 34 mulheres, total 70

7.º distrito – 24 homens, 16 mulheres, total 40

Das 402 pessoas que faleceram em 1914, 244 eram solteiros, 113 casados, 44 viúvos e um de estado ignorado.

Quanto à nacionalidade:

Brasileiros – 302

Italianos – 53

Alemães – 39

Família do austríaco Ernesto Müller foi uma das que entrou na estatística
- Acervo Família Ernesto Müller

Diversos – 7

Ignorado – 1

Soma: 402

Na cidade observaram-se as mesmas condições de letalidade:

Em 1912 – 231

Em 1913 – 219

Em 1914 – 217

As classes de moléstias que mais concorreram para o obituário geral foram as gerais, com o coeficiente de 52 casos e delas a tuberculose com 27.

ESTATÍSTICA ECONÔMICA: A área de agricultura está calculada em 200.000 hectares e computado o valor da produção em 11.500:000$000. Os vegetais, que na safra de 1914/1915 acusam maiores colheitas, são os seguintes:

Arroz – 431.328 sacos

Feijão – 60.500 sacos

Milho – 530.000 sacos [sic] *Deve ser 53.000

Fumo – 80.000 arrobas

Lavoura de arroz com calha de irrigação - MMEL

A exportação municipal do ano de 1914 é representada pelo valor oficial de 5.839:932$000, muito inferior em confronto com a do período passado. Pelo seu valor comercial, o verdadeiro, pois é certo que os gêneros tiveram grande alta, a exportação, sem exagero, produziu 9.650:000$.

A riqueza pastoril, de 17.540:091$500, parte essencial da vida financeira do município, é assim representada:

Vacum – 305.120 cabeças

Cavalar – 46.500 cabeças

Muar – 3.580 cabeças

Lanígero – 33.225 cabeças

Suínos – 41.030 cabeças

Caprino – 1.414 cabeças

Soma: 430.869

ESTATÍSTICA INTELECTUAL:

Instrução: o ensino é ministrado por um estabelecimento de cursos secundários, 36 escolas estaduais, 27 municipais, 24 particulares subvencionadas pelo município e 30 particulares isolados. A frequência tem progredido, ano a ano. A matrícula de 1915 em todos os estabelecimentos escolares era de 4.589 alunos, sendo 828 dos municipais, 681 dos subvencionados, 1.476 dos estaduais e 1.599 dos particulares.

Colégio Alemão-Brasileiro, inaugurado em 1914 - MMEL

Havendo uma população com idade escolar de 9.449, ainda 4.860 crianças não frequentam escolas, ou seja a alta percental de 56%.

ESTATÍSTICA MORAL:

Criminalidade: À cadeia civil desta cidade foram recolhidos, de setembro de 1914 a setembro de 1915, pelas causas adiante enumeradas, 121 indivíduos, ou menos 86, se confrontarmos com o igual período anterior. Assim obtemos:

Homicídios - 9 em 1913/1914 e 5 em 1914/1915

Tratativas de homicídio - nenhuma em 1913/1914 e 4 em 1914/1915

Lesões corporais – 5 em 1913/1914 e 18 em 1914/1915

Defloramento – 1 em 1913/1914 e 4 em 1914/1915

Roubo – 9 em 1913/1914 e nenhum em 1914/1915

Furto – 3 em 1913/1914 e 11 em 1914/1915

Moeda falsa – 1 em 1913/1914 e nenhuma em 1914/1915

Desordem – 113 em 1913/1914 e 57 em 1914/1915

Desobediência – 20 em 1913/1914 e 11 em 1914/1915

Ofensas à moral – 4 em 1913/1914 e 3 em 1914/1915

Embriaguez – 21 em 1913/1914 e 6 em 1914/1915

Vadiagem – 4 em 1913/1914 e nenhuma em 1914/1915

Loucura – 4 em 1913/1914 e 2 em 1914/1915

Averiguações – 13 em 1913/1914 e nenhuma em 1914/1915

Soma: 207 em 1913/1914 e 121 em 1914/1915

 (Fonte: Jornal O Commercio, Cachoeira, Ano XVII, N.º 840, de 5 de janeiro de 1916, p. 1)

Como se vê, pelos dados acima transcritos, a seção de estatística da Intendência fazia uma radiografia do município, servindo-se para isto das informações recebidas dos subintendentes dos distritos. Aliás, percebe-se a enorme importância da zona distrital, ou colonial, perdida pelo município a partir da segunda metade da década de 1950, o que justifica e materializa o descenso populacional e o decréscimo econômico de Cachoeira verificado a partir de então.

Relatórios como este são capazes de transportar no tempo, assim como reforçar o quanto as ações do passado ditam o presente e o futuro.