Existem
datas que são guardadas na memória desde os tempos dos bancos escolares, quando
ainda era usual no estudo da história fixar os acontecimentos no tempo, com dia, mês e ano, e
associá-los a personagens. Assim, a cada 13 de maio vem à memória a assinatura
da lei áurea e a figura da Princesa Isabel, símbolo do rompimento formal, em 1888, do
ciclo desumano que foi a escravidão.
Lei Áurea assinada pela Princesa Isabel - 13/5/1888 - InfoEscola |
A
propaganda abolicionista ganhou corpo a partir de 1884, espalhando-se pelas
cidades e atraindo principalmente jovens também partidários da ideia da república. A luta pela libertação dos negros cativos ganhou vozes poderosas, principalmente no
jornalismo.
Em
Cachoeira, a propaganda também se fez forte e chama a atenção uma notícia
veiculada no jornal A Federação, de
Porto Alegre, órgão do Partido Republicano, no dia 10 de outubro de 1884, que revela estar a Charqueada do
Paredão prestes a conceder a liberdade a seus 58 escravos. É importante registrar que
a Charqueada era, à época, a mais poderosa empresa da cidade e maior
contribuinte dos cofres municipais. A sua mão-de-obra devia ser
majoritariamente constituída de escravos e libertá-los foi um ato de vanguarda e digno de
admiração.
Negros empregados na Charqueada - fototeca Museu Municipal |
A
notícia, intitulada Abolição na Cachoeira,
diz o seguinte:
Segundo nos informou um amigo,
é já uma feliz realidade a promessa que fez a importante firma social Viúva
Claussen & Cia. relativamente à libertação dos 58 escravos que possuía na
Charqueada do Paredão. O Sr. Claudio Bodé, que faz parte da firma e é o gerente
da casa estabelecida no Rio Grande, foi propositalmente a Cachoeira conceder as
liberdades prometidas, registrando as respectivas cartas no cartório do tabelião
Peixoto.
Os novos libertados ficarão
sujeitos à prestação de serviços durante tempo determinado, com direito, porém,
a um salário razoável.
São hoje, portanto, homens
verdadeiramente livres, pois, não obstante o ônus de serviços a que estão
obrigados, têm uma justa remuneração pelo seu trabalho.
É digno de seguir-se o grande
ato que acabam de praticar os manumissores* sócios da firma Viúva Claussen
& Cia.
Provam reconhecer e saber
cumprir o dever que lhes impõe a moral de não exercerem o direito de propriedade
sobre o seu semelhante, reconhecido e garantido infelizmente pelas nossas leis;
e ao mesmo tempo que procuram assegurar a sorte dos beneficiados com a outorga
da sua liberdade, dão-lhes trabalho mediante salário, conseguem também braços
que mantenham e façam prosperar o seu estabelecimento industrial.
Sem este emprego os libertos,
de posse de sua liberdade, ver-se-iam talvez sem abrigo, sem uma colocação
capaz de ministrar-lhes os meios de subsistência, lutariam bastante para
encontrar trabalho, esse elemento indispensável na vida social a todos os
homens.
Se conseguirmos uma minuta das
cartas de liberdade dadas pela Viúva Claussen & Cia. aos seus escravos
empregados no estabelecimento do Paredão, a reproduziremos como um aviso aos
interessados, isto é, aos charqueadores de Pelotas.
Aos distintos sócios daquela
firma, com especialidade ao Sr. Claudio Bodé, enviamos as nossas cordiais
saudações. (Jornal A Federação, 10/10/1884, p. 2).
Chama atenção na matéria o quanto o jornalista valorizou o ato dos administradores da Charqueada, ressaltando nele a previdência de associar à liberdade os meios para que os escravos conseguissem sua subsistência, clara indicação de que as ideias abolicionistas demonstravam preocupação com o futuro dos libertos e que a "propaganda" não era uma mera bandeira, mas fruto de uma discussão profunda e amadurecida.
Chama atenção na matéria o quanto o jornalista valorizou o ato dos administradores da Charqueada, ressaltando nele a previdência de associar à liberdade os meios para que os escravos conseguissem sua subsistência, clara indicação de que as ideias abolicionistas demonstravam preocupação com o futuro dos libertos e que a "propaganda" não era uma mera bandeira, mas fruto de uma discussão profunda e amadurecida.
*Manumissores: os que concedem a alforria legal de um escravo.
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