Seguidamente
alguém questiona o porquê do calçamento de algumas ruas do Bairro Rio Branco
ser feito com pedras irregulares e tão diferentes dos tradicionais
paralelepípedos. Pois as pedras diferentes, em que pese serem alvos de críticas
por sua irregularidade, são resultado de um momento histórico ímpar, quando
empreendimento público, condições climáticas e solução caseira fizeram parte de
uma importante decisão política.
Corria
o ano de 1927. Cachoeira nunca havia vivenciado tamanha revolução urbana. As
principais ruas e praças viraram verdadeiros canteiros de obras. O resultado da
azáfama estava surgindo a olhos vistos. A Avenida das Paineiras não era mais
dessas velhas árvores. Tipuanas jovens tomavam os canteiros da nova e belíssima
Praça José Bonifácio. Cercadas por delicados anteparos de madeira, necessários
para o seu crescimento seguro, as jovens árvores seriam a moldura de uma praça
com balaústres, bancos, floreiras e luminárias de primeiro mundo. As calçadas
estavam sendo cobertas com um mosaico de padrão especial, cujo nome adotado foi
apropriadamente "Cachoeira", pois cobria grandes extensões de passeios na cidade
que se renovava sob a batuta de João Neves da Fontoura. Os paralelepípedos
cobriam a velha poeira da Sete e de outras ruas. As pedras, vindas de Porto
Alegre, chegavam às toneladas no porto.
Novo aspecto da Rua Sete de Setembro com as obras de urbanização - Fototeca Museu Municipal |
Mas
veio a estiagem. A seca se anunciava nas águas baixas do Jacuí. As grandes
chatas carregadas de paralelepípedos pesados tiveram que interromper a viagem
de Porto Alegre a Cachoeira, pois o risco de encalharem nas águas diminuídas
era grande.
Chegada de paralelepípedos no porto - Acervo Joaquim Vidal |
João
Neves discutia com seus assessores diretos que não era possível interromper as
obras. Tinha planos para encerrar o ano com todas as melhorias concluídas. 1928
seria ano de finalização de mandato e de outros voos. As grandiosas obras de
urbanização que ele herdara – e tocara tão bem – do velho Chico Gama, tinham que
ser concluídas! Não havia espaço para atrasos. Que maçada a dificuldade de
trazer os paralelepípedos! Havia ainda muito trabalho de calçamento a ser
feito, especialmente no ainda jovem Bairro Rio Branco. Eis que alguém anuncia
duas pedreiras da cidade que poderiam fornecer o material necessário.
Santiago
Borba, um construtor, e Dr. Paulo Felizardo, engenheiro, haviam iniciado a
exploração de duas pedreiras, uma localizada próximo da Estação Ferreira e
outra no lugar chamado Enforcados. Consultado o diretor das obras municipais,
Dr. Acylino Carvalho, João Neves resolveu empregar a pedra destas pedreiras nos
calçamentos por concluir.
Estação Ferreira - Acervo COMPAHC |
No
entanto, as pedreiras locais não tiveram capacidade de vencer a encomenda, de
forma que algumas poucas ruas foram calçadas com o “meláfiro preto de grande
dureza”, dentre elas algumas de pouco trânsito no Bairro Rio Branco, local
quase que exclusivamente composto por casas residenciais. As obras de
calçamento foram contratadas pela Intendência na forma de pequenas empreitadas
e solucionaram momentaneamente a interrupção do fornecimento de material por via
fluvial, garantindo que a grande obra de urbanização e modernização da cidade
não fosse interrompida com prejuízo às finanças e aos anseios da
municipalidade.
Uma das obras de calçamento no Bairro Rio Branco - Acervo Coralio Cabeda |
Como
se vê, as pedras irregulares e escuras do Bairro Rio Branco são, muito antes do
que um incômodo ao trânsito – uma lição do passado. Traduzem em sua
irregularidade o regular uso das finanças públicas, do potencial local e o
cumprimento de promessa política. Algo raro e absolutamente irregular nos
nossos tempos!
Muito bom divulgar este assunto, Mirian. Boa escolha!
ResponderExcluirAdoro ler suas histórias da nossa cidade. Por alguns instantes vivo nesse passado cheio de encantos e que me fascina. Parabéns pelo seu exemplar trabalho e incentivo a cultura da nossa cidade
ResponderExcluirObrigada, Júlia! Incentivos como o teu ao meu trabalho me impulsionam. Grande abraço!
ResponderExcluirMuito bom! Continue narrando a história Mirian. De Cachoeira!
ResponderExcluirCertamente, Mário! Obrigada pela leitura.
ExcluirMuito bom! Continue narrando a história Mirian. De Cachoeira!
ResponderExcluirContinuarei! Obrigada!
ExcluirTambém sou um grande admirador do seu trabalho parabéns continue postando.
ResponderExcluirMuito obrigada!
ExcluirMagnífico trabalho, de resgatar e esclarecer fatos como este de nossa história. Parabéns!!
ResponderExcluirObrigada, Evandro!
ExcluirValeu Mirian! Obrigada!
ResponderExcluirOutra bela história sobre nossa terra. Morei na localidade de Enforcados durante minha infância e adolescência, com meus avós maternos, que provavelmente conheceram a tal pedreira, já que nasceram, construíram suas vidas e sua família e faleceram naquele mesmo lugar. Mais uma vez, parabenizo a ti, Miriam, pelo excelente trabalho de resgate histórico do Município, bem como a preservação das memórias da nossa gente.
ResponderExcluirObrigada, Veri! Ainda que existam aqueles que pensem que o passado deva ser sepultado e o entendam como limitador do crescimento presente e futuro, a maioria das pessoas valorizam a memória porque entendem ser ela um importante elo que nos une e aproxima daqueles que nos antecederam. Só o passado é verdadeiramente o nosso tempo, porque já o vivemos ou dele guardamos as lembranças. O presente é totalmente efêmero e o futuro ainda não chegou! Obrigada pelo incentivo.
ExcluirPena que toda a beleza da Praça José Bonifácio se perdeu no tempo. Assim como outros belos prédios.
ResponderExcluirPor isto é preciso divulgar a nossa história, única forma de fazer as pessoas conhecerem o patrimônio que nossa cidade tem e apoiarem a sua preservação. Abraço, Berê!
ExcluirParabéns pelo blog, me faz muito bem ler sobre os acontecimentos de nossa terra, sou uma apaixonada pela nossa cidade de Cachoeira do Sul, obrigada por compartilhar tanta riqueza!
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