Espaços urbanos

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Ponte do Fandango - foto Robispierre Giuliani

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Antônio Chimango - 100 anos

Antônio Chimango, o poemeto campestre escrito por Amaro Juvenal, pseudônimo do cachoeirense Ramiro Fortes de Barcellos, está completando neste ano o seu centenário de lançamento. 


Provável primeira edição de Antônio Chimango
- 1915 -
Considerado uma obra-prima da literatura gaúcha, Antônio Chimango é, na verdade, uma sátira ao Dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros que se tornou desafeto político de Ramiro Barcellos.

Ramiro Fortes de Barcellos - Amaro Juvenal

Lançado em edição clandestina no ano de 1915, o poemeto é a demonstração de somente um dos talentos de seu autor, cuja profissão era a medicina, ofício dividido com o jornalismo e a política.
Em 1915, Ramiro Barcellos estava fora da política, tendo concluído mandato de senador da República em 1906, mas tinha planos de voltar ao Senado. No entanto, o Partido Republicano Rio-Grandense estava apoiando Hermes da Fonseca... 
O jornal O Commercio, edição de 14 de julho de 1915, publicou o texto Traços, interessante deboche ao autor do Antônio Chimango, assinado pelo desconhecido Flavio Antonio:

Traços

Incontestavelmente a "Great Attraction"* do momento político é o Dr. Amaro Juvenal, que consegue localizar na sua pessoa os olhares curiosos de toda a gente.
O Dr. Amaro, muito nosso conhecido, é médico formado que não exerce a sua profissão, porque isto de viver uma criatura a receitar cataplasmas para seus semelhantes deve ser coisa bem aborrecida.
Não. O Dr. Amaro sempre teve vistas mais largas.
É verdade que de uns tempos a esta parte andou um tanto retraído, mas agora faz sua reaparição à Rocambole**, completamente remoçado por esse Elixir da Longa Vida que o Sr. Percival Farqhuar*** injetou-lhe nas veias, em alta dose.
É outro homem: nem sombra daquele velho senador que durante tantos anos recebeu modestamente o seu rico subsídio e concordou com todos os desmandos políticos que agora atribui ao chefe supremo.
Mas que diabo! Era preciso uma reação: já ultimara uma tarefa monumental – aberta a Barra**** como por encanto, recebendo cinco contos por mês para palestrar com os engenheiros que, seja dito de passagem, não fora a conversa fiada do Dr. Amaro nada conseguiriam fazer.
E agora. Não havia mais barras para abrir...
A discussão frigorífica enrejelara-lhe a alma e ele tinha necessidade do movimento.
Que fazer? Uma coisa divertida seria meter-se numa luta política, um pleito eleitoral, por exemplo. Mas com que fim?
Ao menos para demonstrar aos conhecidos que ainda é o mesmo Dr. Amaro de outros tempos e apesar do pelo dos anos ainda não está de miolo mole.
E por que não romper a campanha eleitoral contra a eleição do marechal Hermes à vaga de senador?
Ideia genial!
E foi obra de minutos o Dr. Amaro arranjar as malas, enfiar um guarda-pó e tomar o trem para Cachoeira.
Na gare de sua terra natal, um velho conterrâneo que o conhece dos tempos da Meridional, ao vê-lo descer do comboio asafamado, teve esta frase expressiva: - O Dr. Amaro! Que andará fazendo esta ave?
Depois o propagandista aeroplanou em Cruz Alta, Pelotas, Jaguarão e zás-trás, telegramas para os periódicos:
"Exceção Pedro Osório e sua gente, Pelotas inteira comigo".
"Jaguarão unânime a meu lado, inclusive velhos, crianças e mulheres".
E estava feita a sua base de operações eleitorais. Agora é só escrever pelos jornais para que os votos caiam do céu.
E o Dr. Amaro, obedecendo a impulsos nefelibatas, escolheu a "Noite" para sua tenda de cruzada jornalística, porque está convencido como toda gente que de noite todos os gatos são pardos...

Na mesma edição d'O Commercio, página 2, há a notícia de que houve uma reunião política em Cachoeira, no dia 9 de julho de 1915, na pensão de José Wetternick, na Rua Moron, em que o Dr. João Neves da Fontoura aclamou a candidatura a senador de Ramiro Fortes de Barcellos, em oposição à do Marechal Hermes da Fonseca.
Ramiro foi derrotado e durou pouco. Em janeiro de 1916 faleceu, infectado em um ferimento aberto no dedo.


*Great Attraction: grande atração, em inglês.
**Rocambole: obra do escritor francês Ponson du Terrail, cujo personagem é um aventureiro. Daí surgiu o termo "rocambolesco", ou seja, algo extraordinário, complicado e inverossímel.
***Percival Farqhuar: investidor americano com muitas obras no Brasil, dentre elas a Barra do Porto de Rio Grande, de que Ramiro Barcellos foi superintendente.
****Barra: Barra do Porto de Rio Grande.

Consulte outras postagens sobre Ramiro Fortes de Barcellos acessando o espaço para pesquisa, no canto superior esquerdo da página inicial do Blog.

3 comentários:

  1. Oi Mirian, coisa boa chegou a última postagem, aguardava ansioso como sempre e para minha surpresa, o que encontro na capa ? Tenho comigo guardado a décadas um exemplar igualzinho a esse, como ajunto tudo, guardei, mas nunca conseguia entender da importância do mesmo, agora me esclarecestes, obrigado !

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  2. Muito bom Mirian. Só não ficou claro quem faleceu em 1916, por conta do ferimento no dedo.

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    1. Roberto, boa esta tua observação. Vou rever o texto e fazer o ajuste necessário. Quem morreu foi o Dr. Ramiro Barcellos. Deve ter contraído uma bactéria no trato dos doentes através do ferimento que tinha em um dos dedos. Valeu!

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