No alvorecer de 1915, o jornal O Commercio, edição do dia 1.º de janeiro daquele ano, sob o título
Tempo e Navegação, publicou o
seguinte texto:
Que calor! É a
exclamação que se ouve agora quase de todos os lábios, pois o verão entrou às
deveras, espantando o frio que ainda sentimos em algumas noites e manhãs da
primeira quinzena de dezembro. Mas temos de submeter-nos pacientemente às
impertinências desse hóspede indispensável por sua natureza, visto ser o verão
que favorece a vegetação, sazona os frutos e permite a produção dos cereais,
além de que amadurece o pasto e promove o engorde dos animais vacuns.
Não obstante as
chuvas abundantes que caíram no fim do inverno e na primavera última, o rio
Jacuí, após poucos dias de ausência do líquido elemento, está consideravelmente
reduzido em seu volume e dentro em breve, se outras chuvas não caírem, só
permitirá aos vapores de pequeno calado a navegação ao porto desta cidade.
No alvorecer de 2015, cem anos depois, podemos dizer
que o tempo se repete, exceção ao aspecto atual do Jacuí que, ao contrário de
1915, está abundante em águas. Mas quanto à navegação, talvez o escriba da
notícia acima julgasse impensável que em 2015 ela não existisse mais!
Vapor atracado no porto de Cachoeira - fototeca Museu Municipal |
Na primeira década do século XX e ainda por um bom
tempo depois, o baixo custo dos fretes cobrados pelas companhias de navegação
fazia com que o transporte fluvial fosse o modal preferido. Durante o inverno,
em época de chuvas normais, produtos do trabalho de uma zona riquíssima de
produção, composta pelos sete distritos, escoavam pelo porto da cidade de
Cachoeira. No verão, devido ao período de seca, a navegação no rio Jacuí era
interrompida. Naquela época, o porto fluvial de Cachoeira era mais importante
do que os de Jaguarão, Itaqui, Santa Vitória, São Borja e Uruguaiana.
Açúcar,
arame, aguardente, calçados, café, farelo, fazendas, farinha de mandioca, de
trigo, ferragens, querosene, louças, sal, vidros, vinhos e outras mercadorias
ofereciam significativo movimento no porto, transportadas em mais de vinte
embarcações das companhias Jacob Becker & Cia., Eduardo Geherck & Cia.
e Alberto Moreira, principalmente. Além das embarcações de grande porte, das
quais se destacavam o vapor D. Pedro, da Companhia Jacob Becker, e o vapor
Santo Ângelo, de Eduardo Geherck & Cia., muitas outras, de pequena
tonelagem, trabalhavam no interior do Município no transporte de arroz de
várias empresas arrozeiras localizadas às margens do Jacuí. Essas embarcações
eram conhecidas como gasolinas. Destacavam-se, entre elas: Progresso, de Zinn
& Filhos, Doralina, de Manoel Carvalho, Neptuno, de Antônio F. Gomes,
Garibaldi, de Neves & Cia., Beija-Flor, de Baptista Carlos & Filhos, Primavera,
de Eduardo Wollmann, Audaz, de Albino Pohlmann, Dona Joana e Natal, de Porto
Alegre.
Porto de Cachoeira movimentado - fototeca Museu Municipal |
O tempo seguiu mais ou menos similar nesse período de
100 anos, mas a economia de Cachoeira do Sul certamente seria outra se a
navegação não tivesse sucumbido.
Quem sabe daqui a 100 anos algum curioso leitor não
descubra este texto e igualmente julgue impensável ter Cachoeira perdido por um
longo tempo a navegação no Jacuí! Mas esta será uma prerrogativa do futuro. Por
enquanto, só podemos analisar o passado!
Nenhum comentário:
Postar um comentário