Na
segunda metade do século XIX surgiu na Europa um novo tipo de revestimento feito
à base de cimento para pisos e paredes: os ladrilhos hidráulicos, também
conhecidos por mosaicos ou beldosas. Este revestimento veio com a proposta de
substituir o mármore, bastante dispendioso, oferecendo variada gama decorativa
que ia desde as formas geométricas até elaborados desenhos de flores, folhas e
arabescos. Muitos dos desenhos também apresentavam forma de composição com
outros, permitindo que fossem criadas molduras ou diferentes combinações
através do uso planejado das peças, o que sofisticava a produção e a instalação.
Ladrilho hidráulico localizado no prédio do Paço Municipal, atestando intervenções pontuais em diferentes épocas - foto Renato F. Thomsen |
Ladrilhos e madeira preservados no restauro do Paço Municipal - foto Renato F. Thomsen |
A
partir de 1921, quando Cachoeira civilizadamente deu seus primeiros passos para
o saneamento da cidade, com distribuição de água e paulatinamente a instalação
de rede de esgotos, os ladrilhos hidráulicos começaram a despontar como
alternativas para as instalações sanitárias que surgiam. E desde 1918 o jornal O Commercio noticiava o estabelecimento
de Fernando Rodrigues, a Fábrica de Beldosas – Mosaicos, produtora de granito à veneziana, piletas para cozinhas,
soleiras, degraus, balcões, balaústres para janelas, platibandas e o mais concernente
ao ramo. Seu endereço então era a Rua Saldanha Marinho nº 70.
Em
1925, quando Cachoeira estava tomada de obras de ampliação do serviço de água,
com a construção da segunda hidráulica, composta pelas instalações de captação junto ao rio Jacuí e pelos reservatórios elevado (Château d’Eau) e enterrado
(R2, na atual Praça Borges de Medeiros), Fernando Rodrigues havia transferido sua fábrica para a Rua 15 de Novembro, esquina com a Rua Major Ouriques. Naquela época oferecia mosaicos já colocados nas calçadas ao preço de 15.000 réis o metro
quadrado, propagandeando que este valor era inferior ao da colocação de laje. Deve
ter sido eficiente nesta divulgação porque boa parte das construções de
Cachoeira que remontam à década de 1920 possui ladrilhos em profusão.
Ladrilhos da Casa Kanan - demolida - atual Registro de Imóveis - foto Eduardo Minssen |
Haguel
Botomé, o proprietário da famosa Casa da Bandeira Branca, vizinho do fabricante Fernando Rodrigues, foi um dos que comprovadamente
serviu-se do produto da Fábrica de Mosaicos – Beldosas e mandou arrancar as
lajes e tijolos das calçadas circundantes do seu estabelecimento,
substituindo-os pelos mosaicos fabricados em Cachoeira. E bom marqueteiro que
era de seu negócio, encomendou a Fernando Rodrigues o famoso letreiro CASA DA
BANDEIRA BRANCA, escrito em letras vermelhas sobre fundo branco. Os pedestres
não ficavam indiferentes ao que liam quando cruzavam a calçada da Rua 15,
esquina General Osório... Pena que os letreiros desapareceram, levando com eles
um pedaço da história de empreendedorismo da Cachoeira de outrora...
Letreiros "Bandeira Branca" - Google Maps - Colaboração: seguidor Paulo Brendler |
Os
ladrilhos foram sendo substituídos por peças mais modernas e eficientes,
começando a decair na década de 1960. Da fábrica de Fernando Rodrigues não há
maiores notícias, tampouco se sabe até quando forneceu seus produtos. O fato é
que Cachoeira do Sul é uma cidade que muito se serviu dos ladrilhos,
revestimento usado em profusão nas calçadas das ruas principais, tendo
inclusive o direito de denominar o padrão utilizado com o nome
"Cachoeira".
Rua 7 de Setembro e as calçadas no padrão "Cachoeira" - foto Claiton Nazar |
Hoje os ladrilhos hidráulicos são bastante valorizados por colecionadores, designers e decoradores, havendo inclusive “cemitérios” destas peças em grandes cidades para comercialização, com ampla aceitação.
Parabéns pela bela pesquisa, Mirian. Cachoeira tem seu lado "oculto", que aos poucos se revela e o teu trabalho é parte fundamental do processo.
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